Notícias

Cáritas: Identidade e Missão

Cáritas: Identidade e Missão – conferência do Pe Pellicer nas Jornadas “Acção Social da Igreja e Pastoral para hoje” (Cáritas de Coimbra, 2003)

  

CÁRITAS: IDENTIDADE E MISSÃO



JORNADA “ACÇÃO SOCIAL DA IGREJA E PASTORAL PARA HOJE”   22 DE MAIO DE 2003   COIMBRA

 

 

 

 

 

 

PE. SALVADOR M. PELLICER, Religioso Camiliano

– Delegado Episcopal de Cáritas Espanhola –

 

IDENTIDADE E MISSÃO DE CÁRITAS(*)


            Antes do nascimento da “Cáritas” como uma instituição, a Igreja já vinha, desde o princípio, vivendo a caritas (palavra latina que significa caridade) como parte integrante da sua própria identidade eclesial.


Os primeiros seguidores de Jesus, além de se reunirem para ouvir a Palavra e celebrar a Eucaristia, punham tudo em comum para que a ninguém faltasse nada daquilo que lhe era necessário para viver dignamente.


Estas três dimensões: o Anúncio da Palavra, a Celebração dos Sacramentos e a Caridade feita Serviço, constituem a missão da Igreja. Estas três dimensões juntas, sem esquecer nenhuma delas e sem separá-las umas das outras, são as que evangelizam. Com a sua união, a três apresentam a mensagem completa de Cristo, a Boa Nova, aos homens e às mulheres da terra. As três têm como núcleo central o amor, pois anunciamos o amor que Deus nos tem, celebramos o amor que Deus nos manifesta e fazemos verdade o amor que Deus nos dá com o testemunho de serviço aos outros.



Portanto, Cáritas é o nome que quisemos dar à expressão organizada do amor do Povo de Deus aos mais pobres entre os seres humanos. Assim sendo, ao órgão oficial da Igreja que expressa o amor preferencial de Deus pelos mais pobres foi dado o nome de Cáritas.

 

A Cáritas encontra o seu lugar teológico entre os pobres e excluídos da sociedade. Assim como Jesus de Nazaré se misturava com a gente de mal viver, segundo o julgamento dos seus inimigos, assim a Cáritas é chamada a realizar o seu trabalho entre os homens que têm vindo a constituir o contingente dos excluídos; porque é lá que a Igreja é chamada a estar, como nos recorda o Concilio Vaticano II: “A Igreja abraça com amor todos os que sofrem sob o peso da debilidade humana; mais ainda, reconhece nos pobres e nos que sofrem a imagem do seu fundador, pobre e sofredor, procura aliviar a sua miséria e intenta servir neles a Cristo…” (LG 8).



I – A CARIDADE: MISSÃO E VIDA DA IGREJA

 

No seio da Igreja, comunhão de carismas e comunidade missionária, a Cáritas é um organismo da Igreja que, promovido, erigido e animado pelos Bispos, realiza o ministério da caridade que a eles compete.


A missão permanente e irrenunciável da Cáritas é a de ser Igreja pobre para os pobres. Entre os pobres actualiza os sinais do Evangelho de Jesus; e quando se volta para o interior de si mesma, ajuda à conversão dos fiéis para que contemplem nos pobres o rosto de Cristo e se comprometam na sua acção salvadora.

A Cáritas, ao participar da vida e da missão da Igreja, evidencia que a dimensão da caridade é uma acção consubstancial com o ser da Igreja, sem a qual não seria possível nem crível a acção evangelizadora da mesma Igreja.



II – DIMENSÕES DA CARIDADE


2.1- Dimensão eclesial

            O ministério da caridade integra-se na Igreja Particular e em cada uma das comunidades da mesma, como um elemento essencial da sua vida e missão. Nenhuma comunidade realiza integralmente a sua missão se não anuncia o Evangelho, não celebra a sua Fé e não serve com Amor aos irmãos mais necessitados.


            Então, a Cáritas é uma expressão do amor da Igreja, que tem o seu início no corpo de Cristo e termina no mesmo Cristo, já que o irmão e, especialmente, o irmão mais pobre (Mt 25, 31ss), é lugar teológico do encontro com o Senhor.


            A acção sociocaritativa, como parte constitutiva da missão evangelizadora da Igreja, tem que ser mediadora do modo de ser de Deus, contribuindo assim para tornar mais visível o Seu rosto. Portanto, a Cáritas não é uma associação de livre inscrição, composta por pessoas de bom coração; bem diferentemente, é canal da opção preferencial pelos pobres e é animadora e veículo da participação comunitária dos fiéis nesta acção sociocaritativa e libertadora.

 

            A razão mais profunda e central do ser da Cáritas mergulha as suas raízes e encontra o seu fundamento no Mandamento Novo: “Amai-vos uns aos outros como Eu vos amei” (Jo 13, 34), e na actualização permanente desse amor no seio da Igreja. A tarefa fundamental da Cáritas é a de manifestar o amor preferencial de Jesus pelos pobres, a de animar e orientar esse amor na comunidade, fazendo que seja o mais eficaz possível no serviço aos que sofrem, e a de realizar efectivamente uma das dimensões da tarefa evangelizadora da Igreja. O seu papel é o de “ser ícone permanente do amor de Deus ao homem”.


            Aonde não aparece organizada de maneira visível a dimensão caritativa, a Igreja oferece uma imagem incompleta de si mesma. A Cáritas, como o órgão oficial veiculador da caridade da Igreja, não se pode conceber desvinculada da comunidade eclesial nem do ministério pastoral, já que existe Cáritas porque existe a comunidade cristã e não só porque haja pobres.


            O lugar de referência eclesial da Cáritas tem que ser o seu tornar-se real e efectivamente presente na Igreja Particular. É em cada diocese, em comunhão com o Bispo, que Cáritas encontra o seu lugar dentro da Igreja, agindo como um elemento dinâmico e integrador da pastoral de conjunto. A Cáritas não é uma organização opcional que, a partir de fora, se põe ao serviço da diocese; nem é uma sucursal de uma organização supradiocesana. É, na realidade, um ministério pastoral com que o Bispo promove e garante autorizadamente a responsabilidade da sua Igreja Particular na promoção, actualização e harmonização de uma dimensão irrenunciável da Igreja a que preside: a acção sociocaritativa, como parte essencial da acção evangelizadora, juntamente com o ministério da Palavra e a acção Litúrgica, todas no mesmo plano de igualdade e de importância.



A CÁRITAS É DA COMUNIDADE
 
A caridade mergulha as suas raízes no coração da Igreja; portanto temos que afirmar que não se pode conceber desvinculada da comunidade eclesial. A Cáritas encontra a razão profunda da sua existência no Mandamento Novo: “Amai-vos uns aos outros como eu os amei” (Jo 13, 34). Por isso a Igreja está chamada ao serviço dos mais pobres e necessitados. Existe Cáritas porque existe uma comunidade cristã.
Todo o seguidor de Jesus Cristo, ainda que não pertença à equipa Cáritas, é chamado a servir os outros, especialmente os mais pobres e desprotegidos, e a sentir que a Cáritas é sua. Deve saber que sem a comunidade a Cáritas não existiria, que a Cáritas é da comunidade e que cada cristão faz parte da comunidade.
Algumas vezes pensa-se que a Cáritas é um grupo de gente altruísta ou uma associação de livre inscrição composta por pessoas de bom coração. Temos que sair desse erro. O cristão, ao estar implicado no mandamento do amor, deve tomar consciência de que está chamado a sentir-se Cáritas, sendo que isso não é um obstáculo para que a comunidade delegue nalgumas pessoas a expressão concreta do exercício da acção sociocaritativa, pois nem todos podem, nem têm por quê, exercer todos os ministérios na Igreja. Nós, que estamos na Cáritas, dizemos que assim como todo o adulto baptizado sabe que é cristão, todo cristão deve saber que ele é Cáritas e que a Cáritas é sua, da mesma forma que são suas a doutrina e os sacramentos da Igreja.
A conclusão é clara: a Cáritas é constituída pela comunidade dos baptizados em Cristo, que dá a alguns dos seus membros a missão de desenvolver a acção sociocaritativa.
Portanto, para que a comunidade dos fiéis não coxeie, tem que ser construída sobre um tripé bem estruturado. Isto é, deve anunciar que encontrou a Boa Nova e que vive nela, deve actualizar a Boa Nova nos encontros celebrativos com os irmãos e com o Senhor, e deve manifestar, com o seu serviço, que a Boa Nova chega àqueles que dela mais necessitam, àqueles que todos os dias estão cheios de ‘más novas’, porque foram excluídos.
 

2.2- Dimensão evangelizadora.

            A Igreja existe para evangelizar e a evangelização define a sua missão. A Evangelização é, ao mesmo tempo, conteúdo do Evangelho, motivo de credibilidade e testemunho.


–         Conteúdo essencial do Evangelho: O amor aos pobres é, antes de tudo, mensagem e conteúdo essencial do Evangelho. Antes, e mais do que ser imperativo moral, porque também o é, o amor aos pobres é Evangelho, é Boa Nova, é motivo de alegria porque é anúncio do amor que abraça, que acolhe e que liberta. Depois, e só por isso, é exigência. Jesus anunciou e realizou esse Evangelho.


–         Motivo de credibilidade: Jesus não veio para ser servido, veio para servir, e fê-lo com autoridade.


–         Testemunho: A dimensão sociocaritativa da Igreja expressa com a sua acção os sinais do Reino de Deus: o trabalho, a justiça, a solidariedade com os últimos, o acolhimento incondicional. O testemunho que a evangelização nos reclama, quando se confronta com a situação do nosso mundo, é a opção preferencial pelos pobres.


Ao promover o amor preferencial pelos pobres, a Cáritas participa do ministério da evangelização e aproxima a Igreja dos excluídos e de toda a sociedade.


2.3- Dimensão profética

            – Compromisso com a justiça: O amor preferencial da Igreja pelos pobres pede a sua libertação e exige também o compromisso com a justiça. O amor que não fica só nas palavras, reclama a justiça. Uma Igreja pobre e dos pobres tem que estar irremediavelmente comprometida com a libertação salvadora dos oprimidos: “a acção a favor da justiça e a participação na transformação da sociedade mostra-se-nos como uma dimensão constitutiva da pregação do Evangelho” (A justiça no Mundo, Sínodo 1971). Portanto, a caridade reclama a implantação da justiça como condição necessária do seu próprio progresso. Não existe, então, oposição entre a dimensão da caridade e a dimensão da justiça, ao contrário uma reclama a outra.


            – Dimensão sociopolítica do profetismo: Por caridade política entendemos o compromisso activo e operativo, expressão do amor cristão, a favor dos outros, especialmente dos mais necessitados, e a favor de uma sociedade mais justa e fraternal. Esta dimensão da caridade implica, entre outras, as seguintes tarefas: recordar os direitos dos pobres, analisar as situações em que se ofendem esses direitos, denunciar as injustiças que se praticam, dar as orientações oportunas e colaborar para a realização das mudanças necessárias.


            O ministério da caridade é o ouvido da Igreja que escuta os gemidos sem palavras daqueles que foram silenciados e junta o seu clamor à lamentação apagada daqueles que sofrem, para interpelar com eles os que não podem ou não querem ouvir.


            Juntamente com a irrenunciável acção de denúncia, a Cáritas terá que procurar sobretudo tornar possível que os empobrecidos cheguem a ser os sujeitos-agentes da sua própria história, acompanhando-os na libertação das situações de dependência ou de ignorância e ajudando-os a descobrir as causas que geram a injustiça e a violência estrutural; a caridade adquire, desse modo, a expressão de um esforço continuado pela justiça e pela substituição das estruturas de pecado.


            Numa sociedade como a actual, baseada num neoliberalismo desumanizado e desumanizador, a Cáritas deve promover a mudança social, tanto nas estruturas como nos mecanismos e fundamentos que a sustentam, para conseguir a realização da revolução do amor, da que fala João Paulo II. E dado que a Cáritas não é nem uma associação, nem um movimento, nem uma simples organização, mas sim a Diaconia da Igreja, quando denuncia o pecado social fá-lo em nome de toda a Igreja e implica toda a Igreja; daí que deva fazê-lo de acordo com aqueles que realizam e dirigem o serviço pastoral das comunidades cristãs.


2.4- Dimensão universal

            A caridade, em razão da sua origem e do seu destino, é universal. Deus Pai ama a todos e faz irmãos a todos os seus filhos. A universalidade, longe de distanciar-nos do amor ao próximo, alarga as possibilidades do amor cristão em termos de construção da fraternidade universal. “A pastoral da caridade tem que ser universal como o amor cristão que a inspira. Uma Igreja que se fechasse nos limites estreitos da própria diocese, região ou nação, não seria a Igreja de Jesus Cristo” (“La Caridade en la vida de la Iglesia”, p. 14, Conferencia Episcopal Española). Nesta perspectiva, as exigências de justiça e de solidariedade vinculam a Cáritas com todos os povos e, de maneira mais concreta, com o grito dos pobres do mundo inteiro; nesse grito descobrimos e reconhecemos a presença do Senhor que sofre.


            A Cáritas tem uma grande tarefa à sua frente: dar sentido à fraternidade universal, começando pelos últimos da terra. O fenómeno da aldeia global tem que ser lido como exigência de uma acção caritativa mais universal e católica.


            A Cáritas deve suscitar na comunidade cristã e na sociedade o compromisso da solidariedade com os povos. Por isso, deve sentir-se chamada:

a estar junto do mundo dos pobres, sem distinção de língua, género, cor ou procedência;

a discernir a justiça das suas reclamações e a ajudá-los a fazê-las de facto;

a dar a conhecer a sua situação de pobreza, difundindo relatórios e recolhendo todo tipo de ajuda para as suas iniciativas;

a prestar atenção especial às grandes catástrofes, sem esquecer que a maior das catástrofes é a permanente situação de fome e de miséria em que vive grande parte da humanidade.




O ESTILO DE CÁRITAS
A Cáritas, no seu ser e no seu fazer, tem uma atitude e um estilo próprios, que contagiam as pessoas que colaboram com ela. Para integrar-se na Cáritas é necessário deixar-se seduzir pela proposta de estar disposto a entender e a entrar numa dinâmica de progresso pessoal e comunitário que muda a vida. Quanto mais nos introduzimos no saber o que é a Cáritas, mais somos tocados no saber ser pessoa e, em consequência, no saber fazer na vida quotidiana.
Entender que a Cáritas está totalmente vinculada à Igreja, de tal maneira que ela mesma é Igreja, faz-nos perceber a importância de a tornar presente em todas as dimensões do Povo de Deus (paroquial, diocesana, nacional e universal). Em toda a comunidade de fiéis, por mais reduzida que seja, deve estar implantada a Cáritas, porque as pequenas Cáritas fazem maior a Cáritas.
A Cáritas é portadora de Boa Nova, porque o seu testemunho torna visível o amor criador e salvador de Deus no meio dos homens mais ‘desassistidos’. A Cáritas, ao reconhecer a dignidade do pobre, evangeliza explicitamente ao gritar aos quatro ventos que todos os seres humanos são filhos do Pai, que estão salvos no seu Filho pela Encarnação e que mesmo os que não crêem possuem as sementes do Verbo pela acção do Espírito. Assim, a Cáritas torna-se a expressão do coração, das mãos, dos olhos…, numa palavra, da ternura de Deus que convoca à fraternidade universal.

 

III- AS FUNÇÕES PERMANENTES DA CÁRITAS


3.1- Animação comunitária

            A Cáritas é chamada a animar e a participar activamente em todas as iniciativas de solidariedade justa que surjam na Igreja e na sociedade. As razões que a levam a isso são, em primeiro lugar, que é em nome da comunidade cristã que ela desenvolve o ministério da caridade e, em segundo lugar, que é neste serviço que se torna visível boa parte do amor afectivo de toda a comunidade cristã pelos pobres.

           

A animação da comunidade compreende, entre outras, as seguintes tarefas:

–         Conscientizar as comunidades cristãs e todos os seus membros de que o serviço aos pobres é um elemento essencial da identidade e da missão evangelizadora da Igreja.

–         Promover processos de discernimento cristão sobre as condições de vida dos pobres.

–         Promover a vida associativa e potenciar a acção comunitária a partir da base.

–         Impulsionar a comunicação cristã de bens.

–         Organizar adequadamente a Cáritas como diaconia.


3.2- Formação

            A função de animar a comunidade exige a adequada formação de todos os que assumem tarefas no exercício do ministério da caridade.


            A Cáritas deve ter um papel de relevo neste esforço de formação, para conseguir que a comunidade reflicta sobre as implicações próprias do exercício da caridade, e para marcar um processo pedagógico que combine entre si o conhecimento crítico da realidade, as diferentes técnicas de intervenção social e o cultivo de um perfil pessoal e comunitário profundamente solidário. A Cáritas assume a responsabilidade de facilitar esta formação e acompanhamento àqueles que praticam e animam a pastoral da caridade.


            Esta formação abarca:

–         As exigências da caridade, a partir da vivência da fé e do sentido de pertença a uma comunidade de fé.

–         A análise e a leitura cristã da realidade.

–         A concepção do ser humano como um ser único, cheio de potencialidades e capaz de participar, mediante a sua relação com os outros, na construção da sua própria história.

–         A promoção do espírito de gratuidade, e o voluntariado como a expressão mais nobre da mesma, facilitando o crescimento pessoal, a equipa e a coordenação.

–         O acompanhamento permanente que leva a ser simultaneamente teólogo, técnico e testemunha.



3.3- Promoção de acções significativas

            A Cáritas, de acordo com a sua própria identidade, terá que impulsionar e colaborar com todas as iniciativas que se promovem na Igreja e na sociedade a favor dos pobres. Nalguns casos, deverá promover e manter iniciativas próprias e de outras instituições eclesiais, enquanto que noutros casos poderá exercer o direito de colaborar nas acções promovidas tanto pela sociedade civil como pelas administrações públicas.


            Em qualquer dos casos terá que zelar para que os pobres e excluídos sejam incluídos sempre no centro das acções que lhes são dirigidas, como sujeitos primeiros do seu próprio desenvolvimento, evitando todo tipo de proselitismo e paternalismo que suponha a manipulação do irmão necessitado.


3.4- Coordenação da acção sociocaritativa

            A Cáritas, que existe na Igreja para ser um autêntico âmbito de encontro do imperativo eclesial do ministério da caridade, é chamada a ser o lugar de encontro da comunidade cristã para um melhor serviço aos pobres. Esta coordenação da acção social deve contemplar, entre outras, as seguintes tarefas:

 

–         Reconhecer, animar e apoiar a diversidade de carismas e serviços existentes na comunidade eclesial.

–         Facilitar o encontro, o intercâmbio e a colaboração de comunidades, instituições, grupos e pessoas que agem no âmbito da pobreza e da exclusão.

–         Vincular a acção sociocaritativa tanto à pastoral de conjunto como, em concreto, às outras acções fundamentais da comunidade cristã: anúncio do Evangelho e celebração da Fé.


Para que esta coordenação seja efectiva, a Cáritas deve estar integrada na pastoral orgânica da diocese e, através dela, na sua missão evangelizadora. Para isto, a Cáritas deve estar presente na planificação e nos orgãos de pastoral de conjunto diocesana, trazendo-lhes a palavra que lhe compete.


3.5- Comunicação cristã de bens

            A comunicação cristã de bens é a expressão da comunhão eclesial e um sinal da vitalidade da mesma: “Todos somos chamados a aliviar a miséria dos que sofrem perto ou longe de nós, não só com o supérfluo mas também com o necessário” (SRS, 31)


            A Cáritas deve mobilizar a comunidade cristã na perspectiva de partilhar fraternalmente toda a espécie de bens, não só os económicos, mas também a cultura, a saúde, o tempo, o território, os espaços de vida, os valores e tudo aquilo que diz respeito à vida do ser humano.



            As Cáritas diocesanas têm que ser o aglutinador da comunhão de bens de qualquer índole entre as comunidades paroquiais e têm que apoiar, com os recursos que venham a ter à sua disposição, as obras e os serviços que elas criam ou os que outras instituições eclesiais de acção sociocaritativa fomentam.

 

 

 
A GRANDE FAMÍLIA DE CÁRITAS
 
Assim como a Igreja, sendo uma, se organiza em dioceses e paróquias, assim a Cáritas, sendo parte dela, se divide em idênticas circunscrições. E tão similar é à Igreja que quando esta cria estruturas intermédias para uma melhor atenção pastoral, normalmente aparece uma Cáritas de características análogas. Tudo isso é assim organizado para se conseguir levar a cabo serviços comuns que apresentem uma maior eficácia e economizem meios, sem que nem a Cáritas diocesana e menos a Cáritas paroquial, unidas na mais profunda eclesiologia, percam a sua identidade e as suas funções. A organização e as funções dos diferentes âmbitos da Cáritas são os seguintes:
– Cáritas internacional: a Cáritas internacional depende da Santa Sé e é presidida por um Bispo. É a confederação das 194 Cáritas nacionais que existem na actualidade. A sua missão é coordenar a acção sociocaritativa da Igreja em todo o mundo, sobretudo nos casos de grandes catástrofes e emergências e nos planos globais de desenvolvimento.
Cáritas Europa: É uma das sete grandes regiões em que está dividida a Cáritas internacional. Reúne as diferentes Cáritas nacionais do nosso continente. É presidida por um Bispo e ajuda a coordenar acções específicas e a programar projectos de intervenção e animação.
– Cáritas espanhola: Depende da Conferência Episcopal que age através da Comissão de Pastoral Social, onde se nomeia um Bispo que se encarrega da Cáritas, nomeia o delegado episcopal, o presidente e o secretário geral. Este triunvirato, cada um a partir da sua missão e função, dirige este órgão da Igreja.
A Cáritas espanhola é a confederação de todas as Cáritas diocesanas de Espanha e de mais uma série de instituições também a ela confederadas: Confer, Fers e Família Vicentina. Entre os seus objectivos podemos assinalar: ser o aglutinador da comunhão cristã de bens de toda a índole; a coordenação da actuação dos seus confederados, sempre respeitando a autonomia de cada um, a potencialização da actuação e a actualização de todos os seus membros; a promoção da formação de agentes mediante a organização de jornadas, cursos, estudos e publicações…; a denúncia das situações injustas que suportam os excluídos no nosso país e nos países mais pobres da terra; e a coordenação da ajuda aos países que sofrem catástrofes e emergências. Para tudo isto a Cáritas espanhola conta com um departamento de Serviços Gerais.
Cáritas autonómicas: São entidades de encontro e de diálogo, coordenação e administração para as Cáritas diocesanas e as instituições confederadas das comunidades autónomas. Desta maneira se potencia a ajuda mútua diante dos problemas, planificações, programas e actividades de âmbito territorial comum.
Cáritas diocesanas: O seu presidente é o Bispo diocesano, que nomeia um delegado episcopal, um director e um secretário geral para que dirijam a instituição. A Cáritas diocesana é um orgão ao serviço da diocese em geral e de todas e cada uma das paróquias e instituições confederadas. A Cáritas diocesana opera por meio de recursos humanos, económicos e técnicos. Realiza programas e serviços que pela sua envergadura e complexidade superam as possibilidades das paróquias e arciprestados… É o meio da comunicação cristã de bens entre as diferentes comunidades e zonas da diocese, por meio do Fundo Diocesano. Age como instrumento de arrecadação a favor dos países do Terceiro Mundo. Forma os agentes da Cáritas. Sensibiliza a sociedade em geral, denunciando os graves problemas de injustiça e de exclusão social, e compromete-se na procura de soluções para os mesmos.
Cáritas arciprestal e interparoquial: São organizações de serviços, cujas funções principais são as de coordenação, as de melhorar esforços e de atender aos problemas que ultrapassam o âmbito das paróquias.
Cáritas paroquial: O primerio núcleo da acção sociocaritativa da Igreja é a paróquia, portanto também o é da Cáritas. Assim como o Bispo dá a missão ao Pároco para que presida à comunidade na fé e a guie na santificação, também a dá para que acompanhe o exercício do serviço à caridade. O pároco é o presidente nato da Cáritas. Cada Cáritas paroquial tem um director. A Cáritas leva a cabo a realização da acção caritativa e social da comunhão cristã de bens em todas as suas formas e ajuda à promoção e ao desenvolvimento integral dos mais pobres.
Todas estas formas da Cáritas se apresentar contam com os seus estatutos, as suas equipas de direção, os seus conselhos gerais, os seus comités executivos e as suas assembleias. Estas últimas são os seus principais órgãos de governo e de decisão, mas os seus acórdãos e conclusões têm que ser sempre ratificados por aqueles que presidem à caridade na Igreja, os Bispos, Pais dos pobres, usando uma antiga expressão deixada pelos Padres da Igreja.
Também a composição e a estrutura da grande família da Cáritas, assim como os diferentes aspectos da nossa identidade, que foram abordados ao largo desta exposição, expressam com clareza a peculiaridade do ser, do fazer e do estar da Cáritas. São estes traços específicos que configuram o núcleo da acção desenvolvida pela Cáritas para mudar as estruturas sociais, a chave da sua relação com os membros mais débeis da sociedade, as propostas que lança a todos os seus colaboradores e voluntários para se comprometerem na luta pela justiça, e do seu lugar no seio da Igreja como resposta activa e organizada da comunidade crista à opção preferencial pelos pobres.
Esta é a bagagem com que a Cáritas caminha na sua tripla tarefa de denunciar, anunciar e transformar. Tudo o que faz com que, na Cáritas, trabalhemos pela justiça.

 

 

IV – A MÍSTICA E A ESPIRITUALIDADE DE CÁRITAS

 

A Cáritas, diaconia do ministério da caridade, assume “as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens do nosso tempo, sobretudo dos pobres e de todos os que sofrem” (GS, 1). Ao assumir as suas condições de vida, ao apoiar as suas justas aspirações e ao carregar os seus sofrimentos, descobre e identifica nos pobres a Jesus Cristo. A espiritualidade que nos é proposta a partir da Cáritas, como em toda a espiritualidade cristã, é a do seguimento de Cristo. Somos chamados a um lugar de morte e de ressurreição. A Páscoa cristã reproduz-se tanto nos sinais de Morte: pobreza, desumanização, exclusão social, ‘insolidariedade’; como nos sinais de Vida Nova: criação de novos processos concretos de crescimento e libertação, empatia e acolhimento incondicional aos mais pobres, salvação para os marginalizados.


            O Mistério da Encarnação prolonga-se no ministério da caridade, quando a comunidade cristã e cada um dos seus membros reconhecem a dignidade dos pobres, partilham os seus problemas e apoiam as suas legítimas aspirações. Nessa tarefa não basta remendar o que foi rasgado, é preciso renascer a partir de uma nova dimensão.


            A mística da Cáritas tentar juntar a vida no Espírito com as atitudes diante da pobreza. Que o desenho da mística de uma instituição se verifique, no dia a dia, depende da encarnação concreta de tal mística nas pessoas que a integram.


            A opção preferencial pelos pobres está enraizada no próprio coração da vida do Espírito, pelo que toda a espiritualidade cristã tem que ser colocada numa relação harmónica com a pobreza e com os pobres. Então, a vida segundo o Espírito supõe a relação pessoal com os pobres, leva ao estudo das suas condições de vida, à analise das causas que as produzem, empurra para a procura de soluções e converte a misericórdia intimista em paixão pela justiça.

            A espiritualidade da Cáritas, vivida na quotidianidade, convida-nos a adoptar algumas atitudes e algumas acções concretas:


–         Adesão à pobreza evangélica: É incompatível com o Evangelho viver na abundância enquanto que a outros lhes falta o necessário. Mais ainda, o amor aos pobres leva consigo a opção pela pobreza evangélica como forma de vida simples e modesta, que liberta a existência de modelos de comportamento que geram a acumulação de riquezas.


–         Experiência concreta de partilha: a Cáritas não pode ser só um órgão que canaliza a partilha dos outros. Deve ser uma autêntica experiência de partilha.


–         Proximidade e convivência com os pobres: Aos pobres não basta que alguém se lembre deles. O lugar privilegiado da Cáritas é o trabalho a partir da base, encarnado e simples, acompanhando e criando esperança, próximo e estimulante.


–         Autenticidade e profundidade nas nossas vidas: São dois aspectos que nunca estão concluídos. Mais do que uma autenticidade proclamada, trata-se de nos fazermos autênticos a nós próprios, estando dispostos à mudança e à modificação de atitudes e opções.


–         Gratuidade como eficácia do amor: O amor cristão, porque é amor verdadeiro, tem que ser eficaz; não é um amor idealista nem abstracto, mas pelo contrário, parte das necessidades concretas do outro. O mundo dos pobres ensina-nos como tem que ser o amor cristão – que deve ser certamente gratuito e tem que procurar a transformação eficaz.


–         Consciência de que somos enviados: A missão não é somente um trabalho ou uma actividade; a missão, a diaconia caritativo-social, é uma questão fundamental de vida e do estilo de vida. Trata-se do lugar aonde, sendo enviados, se dá o testemunho do Cristo compassivo e misericordioso aqui e agora. O serviço, para que seja diaconia de caridade, deverá realizar-se tal como o realizou Jesus, ou seja, impulsionado pelo mesmo espírito.


Assim daremos razão da nossa fé, da nossa esperança e da nossa caridade, já que:


–         A FÉ SE VERIFICA NO TESTEMUNHO,

–         A ESPERANÇA SE FAZ CRÍVEL NO TESTEMUNHO,

–         E A CARIDADE É TESTEMUNHO.


Pe. Salvador M. Pellicer, Religioso Camiliano

– Delegado Episcopal de Cáritas Espanhola (na data desta Conferência) –



(*) Palestra a partir de: “Reflexión sobre la Identidad de Cáritas” (Cáritas Española); “Cáritas más que una ONG” (Folletos Cáritas, nº1).
Partilhar:

Deixe uma resposta

Cáritas

A Cáritas Portuguesa é um serviço da Conferência Episcopal Portuguesa. É membro da Cáritas Internationalis, da Cáritas Europa, da Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade, da Confederação Portuguesa do Voluntariado, da Plataforma Portuguesa das ONGD e do Fórum Não Governamental para a Inclusão Social.

Cáritas em Portugal

Contactos

Rua D. Francisco de Almeida, n 14
3030-382 Coimbra, Portugal

239 792 430 (Sede) – Chamada para rede fixa nacional

966 825 595 (Sede) – Chamada para rede móvel nacional

239 792 440 (Clínica) – Chamada para rede fixa nacional

 caritas@caritascoimbra.pt

NIF: 501 082 174

Feed

 

Comunicação Institucional