21 de outubro – 29º domingo comum
Equivocados
Tiago e João, filhos de Zebedeu, aproximaram-se de Jesus e disseram-Lhe: «Mestre, nós queremos que nos faças o que Te vamos pedir». Jesus respondeu-lhes: «Que quereis que vos faça?» Eles responderam: «Concede-nos que, na tua glória, nos sentemos um à tua direita e outro à tua esquerda». Disse-lhes Jesus: «Não sabeis o que pedis. Podeis beber o cálice que Eu vou beber e receber o batismo com que Eu vou ser batizado?» Eles responderam-Lhe: «Podemos». Então Jesus disse-lhes: «Bebereis o cálice que Eu vou beber e sereis batizados com o batismo com que Eu vou ser batizado. Mas sentar-se à minha direita ou à minha esquerda não Me pertence a Mim concedê-lo; é para aqueles a quem está reservado». Os outros dez, ouvindo isto, começaram a indignar-se contra Tiago e João. Jesus chamou-os e disse-lhes: «Sabeis que os que são considerados como chefes das nações exercem domínio sobre elas e os grandes fazem sentir sobre elas o seu poder. Não deve ser assim entre vós: quem entre vós quiser tornar-se grande, será vosso servo, e quem quiser entre vós ser o primeiro, será escravo de todos; porque o Filho do homem não veio para ser servido, mas para servir. (Marcos)
No evangelho, continuamos a seguir Jesus no caminho para Jerusalém, onde Marcos intercala as exigências para se ser discípulo de Jesus, isto é, para se ser cristão, com os anúncios que Jesus faz da sua própria Paixão. Assim, entre o texto que lemos na semana passada e este texto há um “terceiro” anúncio da Paixão. Por esta sucessão de “anúncios da paixão”, e pelas cenas que já tinham ocorrido, seria de esperar que os discípulos já tivessem percebido que havia critérios e exigências no seguimento de Jesus que não se coadunavam com poderes, riquezas e louvores mundanos; antes supunham sofrimento, entrega, morte… Mas não! O facto é que Tiago e João, e os outros discípulos, todos, “indignados”, continuavam presos de um “seguimento” carregado de glórias terrenas. Equivocados.
Curiosamente, Mateus diz que foi a mãe de João e Tiago quem fez este pedido a Jesus. Mas Marcos diz que foram eles próprios; Marcos faz sobressair o desacerto próprio dos discípulos, sem descarregar responsabilidades no desconhecimento ou nas amarras afetivas de terceiros. Para Marcos, diante de Jesus, cada um fala por si!
Como estão equivocados, a conversa que se segue entre Jesus e estes dois discípulos está carregada também ela de equívocos, na medida em que Jesus fala de um tipo de cálice e de batismo, e os discípulos entendem outro. Beber do cálice, por exemplo, como ainda hoje acontece nas nossas festas, pode ser entendido como brindar a qualquer coisa: a uma pessoa que fez anos, à vitória de um clube, ao êxito de uma operação financeira…; mas o cálice de Jesus é o sangue do martírio… De algum modo, Jesus continua a “anunciar-lhes a sua paixão”, mas eles não entendem, porque também eles estão tão obcecados pelas riquezas como aquele homem do evangelho da semana passada, com a pequena diferença de aquele já as possuir e os discípulos estarem ainda a sonhar com elas! Dizem que “sim” a Jesus, não por causa de Jesus em si mesmo, mas porque estão inebriados pelas luzes de uma glória sonhada.
Ao fim e ao cabo, o que Marcos denuncia neste texto é a atitude de todos os que se fazem cristãos por outro interesse qualquer, que não seja o do puro e gratuito seguimento de Jesus.
De resto, o pedido destes dois discípulos ainda espanta mais porquanto, como lemos na semana passada, Jesus estava a acabar de lhes prometer – a eles que tinham deixado tudo – cem vezes mais, já neste mundo, em casas, irmãos, irmãs, mães, filhos e terras, juntamente com perseguições, e, no mundo futuro, a vida eterna. De repente, percebemos que o coração humano, entregue às suas próprias ilusões, se torna insaciável: ao ter quer juntar o poder e ao poder a glória de um supremo lugar, na esperança de que assim possa ser finalmente feliz. É uma coisa “tão humana”, uma coisa que nos invade de tal modo, que Jesus resolveu parar, chamá-los para junto dele, e falar-lhes sem equívocos: a vossa lógica não deve ser a lógica do poder mundano, mas a lógica do serviço: quem entre vós quiser tornar-se grande, será o vosso servo. Sabereis que isso é verdade, olhando para mim. Com que “lógica de serviço” aos irmãos nos dizemos cristãos e cristãs?
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