12 de janeiro – Festa do Batismo de Jesus
Soprar a torcida que ainda fumega
Diz o Senhor: «Eis o meu servo, a quem Eu protejo, o meu eleito, enlevo da minha alma. Sobre ele fiz repousar o meu espírito, para que leve a justiça às nações. Não gritará, nem levantará a voz, nem se fará ouvir nas praças; não quebrará a cana fendida, nem apagará a torcida que ainda fumega: proclamará fielmente a justiça. Não desfalecerá nem desistirá, enquanto não estabelecer a justiça na terra, a doutrina que as ilhas longínquas esperam. Fui Eu, o Senhor, que te chamei segundo a justiça; tomei-te pela mão, formei-te e fiz de ti a aliança do povo e a luz das nações, para abrires os olhos aos cegos, tirares do cárcere os prisioneiros e da prisão os que habitam nas trevas». (Isaías)
Pedro tomou a palavra e disse: «(…) Vós sabeis o que aconteceu em toda a Judeia, a começar pela Galileia, depois do batismo que João pregou: Deus ungiu com a força do Espírito Santo a Jesus de Nazaré, que passou fazendo o bem e curando todos os que eram oprimidos pelo demónio, (Atos dos Apóstolos)
Naquele tempo, Jesus chegou da Galileia e veio ter com João Baptista ao Jordão, para ser batizado por ele. Mas João opunha-se, dizendo: «Eu é que preciso de ser batizado por Ti e Tu vens ter comigo?». Jesus respondeu-lhe: «Deixa por agora; convém que assim cumpramos toda a justiça». João deixou então que Ele Se aproximasse. Logo que Jesus foi batizado, saiu da água. Então, abriram-se os céus e Jesus viu o Espírito de Deus descer como uma pomba e pousar sobre Ele. E uma voz vinda do céu dizia: «Este é o meu Filho muito amado, no qual pus toda a minha complacência». (porque Deus estava com Ele». (Mateus)
A crença de que Jesus era Deus não apareceu logo no dia da Ressurreição, nem nos meses a seguir. Nesses dias, para os discípulos era claro que Jesus tinha tido uma missão especial que lhe fora dada por Deus, como lemos na segunda Leitura da missa de hoje. Ficava, todavia, uma pergunta: e quando é que “Deus ungiu do Espírito Santo e de fortaleza Jesus de Nazaré?”. A grande resposta foi: no Batismo. E, por isso, o Batismo de Jesus foi considerado durante algum tempo o acontecimento mais importante da vida de Jesus, sendo apresentado como o momento em que o Pai instituiu uma missão especial para Jesus, e derramou sobre ele o Seu Espírito para que ele pudesse levar essa missão a cabo: “Este é aquele em que pus o Meu enlevo”. Lucas, no texto que lemos na Segunda Leitura, testemunha essa visão através de um discurso de Pedro nesses tempos mais antigos. Mas quando Mateus escreve o seu evangelho, pelos anos 70, já os cristãos acreditavam na divindade de Jesus, ou ao menos que Jesus já tinha uma missão especial desde o seu nascimento. Assim, o batismo de Jesus deixa de ter importância, e até aparece como descabido de significado, pois o Enviado de Deus não precisaria de receber o batismo, antes ele é que teria poder para batizar. E é isso que Mateus afirma com toda a clareza na primeira parte do evangelho de hoje. Então, Mateus justifica o batismo de Jesus como um ato próprio da vontade de Jesus para se inserir na linha messiânica dos Cânticos do Servo de Javé: o Messias como um Servo, como alguém humilde que se dispõe com simplicidade e radicalidade a cumprir até ao fim a vontade do Pai: “que se cumpra a justiça”.
Por isso, vale a pena atendermos à Primeira Leitura, que é tirada exatamente do primeiro Cânticos do Servo de Javé. O profeta traça um “perfil” do Messias esperado com caraterísticas completamente diferentes daquelas que eram idealizadas pelo povo. É um texto belíssimo, de sabedoria ímpar, ainda hoje útil de meditar e praticar. Quanta sabedoria em não apagar a torcida que ainda fumega, e pelo contrário soprá-la para que ela volte a dar luz! E quanta determinação em proclamar fielmente a justiça! É por este “Servo de Javé”, em toda a sua radicalidade, que Jesus de Nazaré norteou todo o seu agir. E é à luz deste “perfil” que Mateus interpreta o batismo de Jesus.
A seguir, Mateus coloca uma teofania, isto é, uma manifestação de Deus através de sinais, sons, palavras. Por esta teofania percebemos que se o Batismo de Jesus nada acrescenta à sua missão, todavia ilumina-a: ele é o “Filho” amado do Pai e aquele sobre o qual o Espírito se manifesta em toda a abundância dos seus dons e frutos.
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