2 de novembro – celebração de todos os fiéis defuntos.
Jesus toma o lugar da sabedoria
Naquele tempo, Jesus exclamou: «Eu Te bendigo, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondeste estas verdades aos sábios e inteligentes e as revelaste aos pequeninos. Sim, Pai, Eu Te bendigo, porque assim foi do teu agrado. Tudo Me foi dado por meu Pai. Ninguém conhece o Filho senão o Pai e ninguém conhece o Pai senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar. Vinde a Mim, todos os que andais cansados e oprimidos, e Eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de Mim, que sou manso e humilde de coração, e encontrareis descanso para as vossas almas. Porque o meu jugo é suave e a minha carga é leve». (Mateus)
A liturgia do dia 2 de novembro, na “Comemoração de todos os fiéis defuntos”, apresenta um conjunto variado de textos passíveis de serem utilizados nas missas. Optámos pelo textos propostos para a “Primeira Missa”.
O Evangelho é de Mateus, tirado da secção sobre “o Mistério do Reino”. A grande novidade deste trecho é que enquanto normalmente o Reino de Deus é lido pelos diversos evangelistas, também por Mateus, à luz dos profetas do antigo Testamento, aqui, neste texto, é lido à luz da sabedoria do antigo Testamento.
Basicamente, o antigo Testamento tem quatro tipos de livros: os livros da Lei, os livros históricos, os livros dos profetas e os livros sapienciais (à volta da sabedoria). Por exemplo, o livro de Job, donde é retirada a 1ª Leitura de hoje, faz parte dos livros sapienciais. Há, de facto, toda uma corrente de sabedoria que atravessa o antigo Testamento, que começa nos tempos mais longínquos pela sabedoria popular, como as coletâneas de provérbios, e que depois se vai aprofundando progressivamente até ao ponto de se “personificar” a sabedoria como um ente profundamente imbricado com Deus: a sabedoria vive uma relação íntima com Deus!
Mas, para Mateus, Jesus toma o lugar da sabedoria. A partir de Jesus, essa relação íntima de Deus com algum ente não se concretiza numa “personificação” cultural da “sabedoria”, mas concretiza-se numa pessoa concreta, histórica, situada no espaço e no tempo: Jesus de Nazaré. Ele é o “Filho” e Deus é o “Pai”. A intimidade de vida não pode ser maior.
Mas esta afirmação, entendamo-lo, é uma rutura com toda a sabedoria histórica do Povo de Deus! Para a cultura judaica do tempo de Jesus, que um homem possa tomar o lugar da sabedoria na intimidade com Deus, é simplesmente absurdo. Por isso os seus sábios e doutores (sacerdotes, fariseus, anciãos…) não conseguem aceitar esta novidade. Apenas os pequeninos, os simples, os que percebem que a pessoa, qualquer pessoa humana concreta, vale mais do que todas as personificações possíveis, apenas esses conseguem aceitar que Jesus de Nazaré assuma o lugar da sabedoria na intimidade com Deus.
Mas não mudam só os atores da intimidade com Deus (Jesus posto no lugar da sabedoria). Muda também a relação de todo o povo com o próprio Deus. De facto, a sabedoria do antigo Testamento impunha ao povo, na sua relação com Deus, toda a Lei do antigo Testamento e, para além da Lei, centenas de prescrições rabínicas que cansavam e oprimiam as pessoas. Jugo pesado, reconhecido como tal pelos próprios rabinos! Agora, diz-nos Mateus, quem segue Jesus é aliviado desse jugo, e a sua relação com Deus é meritória apenas pela mansidão e humildade de coração. Por isso é de profunda paixão pela humanidade o grito de Jesus: “Vinde a Mim, todos os que andais cansados e oprimidos, e Eu vos aliviarei”. Profunda paixão por cada um de nós.
É à luz da profunda intimidade de Jesus com Deus e à luz dessa profunda paixão de Jesus por nós que Paulo, quando conhecedor da ressurreição do Senhor, pode afirmar na fé: “Aquele que ressuscitou o Senhor Jesus também nos há de ressuscitar com Jesus e nos levará convosco para junto d’Ele” (2ª Leitura). É essa certeza da fé que hoje celebramos.
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