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29 de abril – 4º domingo da páscoa

À luz de Ezequiel

«Eu sou o Bom Pastor. O bom pastor dá a vida pelas suas ovelhas. O mercenário, como não é pastor, nem são suas as ovelhas, logo que vê vir o lobo, deixa as ovelhas e foge, enquanto o lobo as arrebata e dispersa. O mercenário não se preocupa com as ovelhas. Eu sou o Bom Pastor: conheço as minhas ovelhas e as minhas ovelhas conhecem-Me, do mesmo modo que o Pai Me conhece e Eu conheço o Pai; Eu dou a vida pelas minhas ovelhas. Tenho ainda outras ovelhas que não são deste redil e preciso de as reunir; elas ouvirão a minha voz e haverá um só rebanho e um só Pastor. Por isso o Pai Me ama: porque dou a minha vida, para poder retomá-la. Ninguém Ma tira, sou Eu que a dou espontaneamente. Tenho o poder de a dar e de a retomar: foi este o mandamento que recebi de meu Pai». (João)

 

                É importante, talvez, começarmos por uma observação muito simples: a visão idílica, romanceada, dos pastores não é verdadeira. Pelo contrário, a vida dos pastores é muito dura: solidão, vida itinerante, falta de conforto, impossibilidade de “férias”(!), abrigos precaríssimos, sujeição aos rigores do tempo e, acima de tudo, o cuidado pelo bem-estar do próprio rebanho, desde os pastos à segurança, passando pela assistência sanitária ou pela ajuda ao gado no ato parir. Ainda por cima, e era assim que acontecia no tempo de Jesus, malvistos pelo resto da sociedade, como gente marginal, associal, sem religião, talvez perigosa… É-se pastor a tempo inteiro, em todas as frentes, nas mais duras condições e sem qualquer reconhecimento social inequívoco. O bom pastor não traz um cordeiro aos ombros; traz o rebanho todo, dia e noite. O bom pastor dá a sua vida, toda e em todos os momentos, pelas suas ovelhas.

                Não espanta, por isso, que haja pastores menos bons, ou até maus pastores; sobretudo pastores que à hora de enfrentarem os lobos (e os lobos atacam em alcateia!) desandem a fugir, recolhendo-se nalgum abrigo ou trepando a algum sicómoro, deixando as ovelhas e os cordeiros entregues à sua (pouca) sorte. E esta é, em boa verdade, uma das ideias mais fortes do texto que lemos, uma violentíssima acusação aos maus pastores, sob a designação de “mercenários”. Para atingirmos a força desta acusação de Jesus, precisamos de reler o capítulo 34 do Livro do Profeta Ezequiel, que os ouvintes de Jesus e os leitores de João conheciam de cor, mas nós não. Eis um extrato:

“Assim fala o Senhor Deus: «Ai dos pastores de Israel que se apascentam a si mesmos! Não devem os pastores apascentar o rebanho? Vós, porém, bebeste o leite, vestistes-vos com a sua lã, matastes as rezes mais gordas e não apascentastes as ovelhas. Não tratastes das que eram fracas, não cuidastes da que estava doente, não curastes a que estava ferida; não conduzistes a transviada; não procurastes a que se tinha perdido; mas a todas tratastes com violência e dureza. Por isso, à falta de pastor, elas dispersam-se e, na sua debandada, tornaram-se a presa de todos os animais dos campos (…); ninguém se preocupa nem as vai procurar» (Ez. 34, 2b-6).

                Portanto, quando Jesus se afirma o Bom Pastor, está também a denunciar, e violentamente, os maus pastores, os “mercenários”. Mas no mesmo texto de Ezequiel, Deus, em contraste com aqueles “maus pastores”, afirma de Si mesmo que Ele próprio será o Bom Pastor: “Eis que Eu mesmo cuidarei das minhas ovelhas e me interessarei por elas. Sou Eu que apascentarei as minhas ovelhas, sou Eu quem as fará descansar” (Ez 34, 11.15). E, logo a seguir, diz que estabelecerá David (o Messias) como o único pastor (v. 23). Portanto, quando Jesus se afirma como o Bom Pastor, reivindica o papel de Deus e o do Messias (David). A afirmação é messiânica (em Jesus cumpre-se a profecia de Ezequiel), mas é também de catequese para os leitores de João: Jesus é Deus.

                A força da imagem para o pastor, serve também para o rebanho. O Povo de Deus, hoje ainda, como rebanho, precisa de bons pastores. Não faltam lobos a atacar o rebanho de todos os flancos; não faltam pragas e epidemias; não falta fome e sede de pastagens mais nutritivas, mais abundantes… Por isso a Igreja, neste Dia do Bom Pastor, pede a Deus santos e bons pastores.

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