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30 de outubro – 31º domingo comum

A cadeira de Moisés

Jesus falou à multidão e aos discípulos, dizendo: «Na cadeira de Moisés sentaram-se os escribas e os fariseus. Fazei e observai tudo quanto vos disserem, mas não imiteis as suas obras, porque eles dizem e não fazem. Atam fardos pesados e põem-nos aos ombros dos homens, mas eles nem com o dedo os querem mover. Tudo o que fazem é para serem vistos pelos homens: alargam as filatérias e ampliam as borlas; gostam do primeiro lugar nos banquetes e dos primeiros assentos nas sinagogas, das saudações nas praças públicas e que os tratem por ‘Mestres’. Vós, porém, não vos deixeis tratar por ‘Mestres’, porque um só é o vosso Mestre e vós sois todos irmãos. Na terra não chameis a ninguém vosso ‘Pai’, porque um só é o vosso pai, o Pai celeste. Nem vos deixeis tratar por ‘Doutores’, porque um só é o vosso doutor, o Messias. Aquele que for o maior entre vós será o vosso servo. Quem se exalta será humilhado e quem se humilha será exaltado». (Mateus)

 

          O relato de Mateus que lemos este domingo enquadra-se no contexto do conflito, em Jerusalém, cada vez mais intenso entre Jesus e os diversos grupos de poderosos judeus em geral, que temos vindo a ler nos últimos domingos. De fato, como vimos, este conflito é com todos os grupos, sejam poderes da estrutura religiosa ou da filiação política: sacerdotes, escribas (ou doutores da lei), zelotas, fariseus, saduceus, herodianos…

          Mas Mateus carrega mais, muito mais!, as cores contra os fariseus. Entre outras causas, é importante perceber uma coisa: quando o evangelho de Mateus acabou de ser composto, o judaísmo como religião praticamente estava extinto. No ano 70 as tropas de Tito tinham arrasado Jerusalém e obrigado os judeus a dispersarem-se. O culto centrado à volta do templo ruiu, e nas sinagogas também. Grupos muito ativos, como os saduceus e a sua classe sacerdotal, como os zelotas, etc., volatilizaram-se. Mas no meio de todo este esfarelar-se do judaísmo, houve um grupo de fariseus que se reuniu em Jâmnia, com uma escola dirigida pelo Rabi Ben Zakkai (é o judaísmo dessa escola que persistiu até hoje). Na prática, do antigo judaísmo, restam dois grupos: os fariseus de Jâmnia e os cristãos. E é entre estes dois grupos que se estabelecem as grandes controvérsias da fé. Ora Mateus escreve o seu evangelho para cristãos convertidos do judaísmo na Palestina, em confronto direto com a escola farisaica de Ben Zakkai e sente necessidade de evidenciar aos cristãos as diferenças que existem entre as duas perspetivas religiosas. Por isso passa ao de leve os conflitos que Jesus teve com todos os outros poderes (que já não são ameaça nenhuma), para se centrar no conflito com os fariseus.

          Dito isto, devemos acrescentar que Mateus tem sempre o cuidado de indicar os destinatários dos discursos de Jesus. Às vezes são dirigidos aos fariseus, querendo significar o poder religioso judaico; outras vezes aos discípulos, querendo significar a Igreja; outras vezes às multidões, querendo significar o mundo… Ora este discurso é dirigido à multidão; ao mundo. Não é, portanto, um ensinamento de Jesus dirigido prioritariamente à sua Igreja, nem sequer um ensinamento dirigido prioritariamente contra os fariseus, mas é um ensinamento para todas as pessoas, um convite à honestidade interior, à coerência de vida entre o dizer e o fazer, entre o pensar e o agir, e um convite generalizado à humildade. É sobretudo um alerta contra a corrupção do poder religioso, que vale tanto para fariseus, como para cristãos, como para as religiões idolátricas do império romano; é um alerta contra esta permanente tentação de nos tornarmos deuses diante dos irmãos, que vale tanto para os mestres religiosos como para os mais consistentes pensadores ateus do século XXI.

          De facto, a “cadeira de Moisés” é o mais tentador e ao mesmo tempo o mais moralmente perigoso lugar na história dos homens. É o lugar do ensino da lei que rege a vida quotidiana das pessoas em nome de um Saber superior. Quem se senta nessa cadeira para ensinar os homens e mulheres, em nome de Deus, facilmente pode torcer tais leis em seu favor pessoal; ou – em nome da doutrina – carregar os outros com fardos pesados, a que ele próprio foge…

            E, todavia, todos temos um pouco de assento nessa cadeira de Moisés. Ou deveríamos ter! Não com o espírito farisaico de quem ensina o que não pratica, mas com toda a humildade, e com a prática concreta do bem: porque todos aprendemos com todos, e todos somos chamados à santidade. É a cadeira onde com a vida ensinamos o que refletimos no domingo passado: que amar a Deus e ao próximo é a chave de todos os outros comportamentos, religiosos ou profanos. Com a vida, não com palavras.

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